Um grupo de 24 trabalhadores venezuelanos com crianças e bebês foi resgatado de condição análoga à escravidão em Rio do Sul, no Vale do Itajaí, na quinta-feira (9). Junto às famílias, eles viviam sem cozinha, colchões e água suficiente, informou o Grupo Especial de Fiscalização Móvel (GEFM). Conforme o órgão, eles trabalhavam na construção de alojamento e de galpões.
De acordo com Maurício Krepsky, auditor fiscal do Trabalho que participou da ação, algumas pessoas do grupo também foram vítimas de tráfico de pessoas, já que chegaram a ser aliciadas em cidades distintas para realizar os serviços. Dois bebês gêmeos recém-nascidos, com 4 dias de vida, e outros menores de idade também foram retirados do local.
Ao todo, 39 pessoas, sendo trabalhadores acompanhados de familiares e filhos, foram levadas para hotéis da região.
A fiscalização da Divisão de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo (Detrae) do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) verificou que homens e mulheres atuaram, por cerca de um mês, em "condições degradantes", o que caracteriza trabalho escravo contemporâneo no Brasil.
Segundo o GEFM, eles também tiveram que construir o próprio alojamento quando chegaram. Durante uma semana, os venezuelanos ficaram instalados em cômodos improvisados, sem camas e banheiro.
Ainda de acordo com o órgão, os venezuelanos foram interiorizados no Brasil através da Operação Acolhida, e já estavam há alguns anos no Estado. O fluxo de imigrantes da Venezuela para o Brasil aumentou consideravelmente desde de 2018.
"[O alojamento foi] feito com paredes de madeira, chão de concreto e telhado de zinco, sendo composto por um quarto pequeno com uma ou duas camas para cada família e seis banheiros de uso coletivo. A fiação elétrica era precária, gerando alto risco de incêndio", detalhou o coordenador da operação, o auditor-fiscal do trabalho Joel Darcie.
Alojamentos foram construídos pelos próprios trabalhadores — Foto: AFT/ Divulgação
As vítimas saíram das cidades de Chapecó e Itapiranga, no Oeste catarinense. Nenhuma delas teve a carteira de trabalho registrada.
Alojamento
Os banheiros, segundo Darcie, eram compostos por um vaso sanitário e um chuveiro, "mas não havia água suficiente para todos".
"Os trabalhadores improvisaram um tambor para armazenamento de água e utilizavam essa água para tomar banho, dar descarga nos banheiros, realizar higiene pessoal, cozinhar, lavar louças e roupas", relatou .
Água armazenada em tambor era utilizada para todos os afazeres — Foto: AFT/ Divulgação
Também não havia fogão ou geladeira nos dormitórios e, por isso, a comida era feita em um fogareiro construído pelos trabalhadores (foto abaixo). Ao saírem de suas cidades, os trabalhadores venderam seus bens pessoais.
Comida era feita de maneira improvisada — Foto: AFT/ Divulgação
"Em um dos quartos do alojamento, a equipe encontrou dois bebês com 4 dias de vida, filhos gêmeos de um dos trabalhadores", disse o coordenador da operação.
Atraídos por oferta de R$ 3 mil
Através de publicação em rede social, em uma página direcionada exclusivamente a venezuelanos, os trabalhadores tiveram conhecimento da oferta de emprego, com vagas com salário de até R$ 3 mil mensais para refugiados no Brasil - tudo com moradia e alimentação fornecida pela empresa.
Trabalhadores, então, saíram de seus empregos no Oeste catarinense, venderam seus bens pessoais, como televisão, cama, guarda-roupa, e viajaram para Rio do Sul, junto com suas famílias. Conforme o GEFM, eles foram transportados em um ônibus contratado pelo empregador.
Pagamento às vítimas
Após a notificação da Inspeção do Trabalho, as vítimas foram retiradas do alojamento e levados para hotéis em Rio do Sul. Os contratos de trabalho foram rescindidos e a empresa efetuou o pagamento, na tarde de quinta, dos direitos trabalhistas devidos.
Foram pagos aproximadamente R$ 140 mil de verbas rescisórias, R$ 100 mil de danos morais individuais e R$ 200 mil de danos morais coletivos. Os valores foram estipulados pela Defensoria Pública da União. A empresa contratante também firmou um termo de ajustamento de conduta (TAC) com o Ministério Público do Trabalho.
Cada um dos trabalhadores terá direito a três parcelas do seguro-desemprego especial, no valor de um salário-mínimo cada. Segundo a Inspeção do Trabalho, a assistência social do município de Rio do Sul está auxiliando as vítimas na procura de moradia para os trabalhadores que optaram por continuar na cidade.
Denúncias de trabalho escravo
Denúncias de trabalho escravo podem ser feitas, de forma remota e sigilosa, no Sistema Ipê, único sistema exclusivo para denúncia de escravidão contemporânea no Brasil. O Sistema Ipê é o endereço oficial do Fluxo Nacional de Atendimento das Vítimas de Trabalho Escravo e foi lançado em 2020 pela Subsecretaria de Inspeção do Trabalho (SIT), em parceria com a Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Fonte(s): g1-SC
Comentários