Uma força tarefa de combate ao trabalho escravo resgatou quarenta e nove trabalhadores submetidos a condições análogas à escravidão em propriedades de cultivo de maçã, em São Joaquim, na Serra Catarinense. A ação integrada pelo Ministério Público do Trabalho, auditores-fiscais do Trabalho da subsecretária de Inspeção do Trabalho (SIT), vinculada ao Ministério do Trabalho e Previdência, com a Defensoria Pública da União – DPU, Polícia Rodoviária Federal e Polícia Federal teve início no dia 29 de março de 2022.
Os aliciados vieram da cidade de Caxias/MA, por um intermediador de mão-de-obra, “gato”, que prometeu às vítimas ganhos vantajosos para trabalharem na colheita de maça. Cerca de 50 embarcaram no Maranhão em um ônibus fretado pelo aliciador e pagaram R$ 650,00 (seiscentos e cinquenta reais) pela passagem. Os que não tinham o dinheiro para a despesa do transporte até São Joaquim, aceitaram a proposta do aliciador de descontar dos dias trabalhados.
Depois de três dias de viagem, no dia 10 de fevereiro de 2022 eles chegaram ao destino, sendo distribuídos em dois alojamentos. Em ambos foram identificadas péssimas condições de higiene e conservação, e superlotação. Num deles, com apenas três quartos pequenos, vinte e dois trabalhadores se amontoavam em cinco ou seis pessoas por cômodo. A casa tinha apenas um banheiro para tomar banho e um vaso sanitário, utilizado por homens e mulheres. No imóvel que contava com um porão, sem nenhuma janela ou ventilação, havia vazamento de água, umidade e mofo pelas paredes e um único banheiro para uso de outros vinte e oito trabalhadores. Os abrigos não dispunham de água potável, cama e armários. Também não eram fornecidos papel higiênico, roupa de cama e colchões aos empregados.
Para ter onde dormir tiveram que pagar R$ 200,00 (duzentos reais) por colchão fornecido, além do valor de R$ 120,00 (cento e vinte reais), cada um, pelo aluguel das casas. Cada um tinha ainda uma despesa de R$ 140,00 (cento e quarenta reais) para o pagamento da alimentação, fora o valor da carne, de R$ 60,00 (sessenta reais), também cobrado pelo aliciador. Em nenhum dos alojamentos havia local adequado para depositar os alimentos que ficavam pelo chão com outros materiais e produtos. Nos cômodos a equipe fiscal encontrou muitas garrafas de aguardente e trabalhadores em estado de embriaguez.
Alojamentos precários
Os resgatados foram vítimas de tráfico de pessoas e tinham limitadas suas possibilidades de deixar o serviço em razão de dívidas contraídas com o aliciador que administrava a execução do serviço nas propriedades dos empregadores. Dois dos três produtores de maçã fiscalizados pagavam a produção dos empregados diretamente para o “gato” que não repassava a totalidade dos valores para os aliciados e na maior parte dos casos, não repassava um centavo, tamanha era o valor dos descontos que fazia.
Ouvido pela equipe fiscal na sede da Polícia Federal em Lages, SC, o aliciador revelou receber uma comissão por cada “bin” medido na produção total da maçã na propriedade. O bin é uma caixa cheia de maçã, forma esta firmada para a remuneração dos empregados. Os bins eram cheios por uma turma de trabalhadores composta de cinco a sete trabalhadores, que dividiam os ganhos do dia pelos componentes da turma, tudo controlado pelo “Gato”.
Como não havia utensílios suficientes, os empregados tiveram que comprar panelas para poder cozinhar. Nos alojamentos, os trabalhadores faziam suas refeições sentados no chão ou sobre suas camas. Já nas frentes de trabalho, os empregadores disponibilizavam almoço, em refeitório que contava com banheiro. Nas plantações, onde eles trabalhavam na colheita, as necessidades eram feitas no mato e sob os pés de maçãs. A água fornecida não passava por qualquer tipo de tratamento ou filtragem e era consumida em condições não higiênicas, com compartilhamento de copos. A jornada de trabalho era de segunda a sábado com intervalo para o almoço e de aproximadas oito horas por dia.
Pós-Resgate
Após notificados pela caracterização do trabalho análogo ao de escravo, ante a existência de trabalho degradante, os empregadores quitaram as verbas rescisórias de todos os trabalhadores resgatados, calculadas pela Auditoria-Fiscal do Trabalho. O valor líquido pago pelos empregadores aos resgatados foi o total de R$174,333,37 (cento e setenta e quatro mil, trezentos e trinta e três reais e trinta e sete centavos). O Ministério Público do Trabalho, representado na operação pelo Procurador do Trabalho Acir Alfredo Hack, determinou o valor de R$10.000,00 (dez mil reais) de dano moral coletivo para cada empregador e a Defensoria Pública da União determinou o valor de R$ 1 mil para cada trabalhador a título de dano moral individual.
Fonte(s): RCO
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