A bancada feminina da Alesc passou pelo constrangimento de ouvir de um colega deputado, que comandava a sessão do Legislativo, que mulheres não precisam estar na Mesa Diretora porque “trabalham mais” no mandato regular. Soa como um roteiro machista e empoeirado: aos homens, liderança e poder de decisão. Às mulheres, o trabalho.
A fala foi feita pelo deputado Kennedy Nunes (PTB), que presidiu a sessão na última terça-feira (16). Ele havia sido interpelado pelo deputado Osmar Vicentini (União Brasil), que perguntou se o Regimento Interno, por um acaso, não poderia prever uma mulher na Mesa.
- Quem sabe a gente sempre colocaria na nossa Mesa Diretora também uma mulher? Não sei se existe essa ordem no Regimento Interno – disse.
O deputado tentou fazer média com a plateia, amplamente feminina. Estava em pauta um projeto de lei da deputada Ada de Luca (MDB) para contemplar a Rede Feminina de Combate ao Câncer em convênios, e o plenário estava repleto de mulheres. O conteúdo da fala incomodou as colegas de Parlamento e provocou reação imediata das colegas deputadas. Nas redes sociais, Luciane Carminatti (PT) escreveu: “Sim, 1 mulher, tipo cota, tipo totem da diversidade, sabe? E para isso ainda questionou se o regimento interno permitia que mulheres ocupassem cargos diretivos”.
As deputadas protestaram ainda mais diante da resposta de Kennedy Nunes:
- Nosso Regimento Interno diz que todos os 40 deputados podem concorrer aos cargos da Mesa. Eu, conhecendo um pouco mais essa Casa, acho que as mulheres aí, fora da Mesa, trabalham mais do que ficar na Mesa.
De todos os espaços de afirmação para as mulheres, a política é um dos mais difíceis e inóspitos, dominada há séculos pelos homens. Apesar das ações de incentivo à participação das mulheres na política partidária, elas ainda ocupam espaços ínfimos de representação nos Executivos e Legislativos país afora – e isso ocorre porque as engrenagens internas são desenhadas para perpetuar as estruturas de poder.
Nesta semana, uma imagem divulgada pela comunicação de Simone Tebet (MDB), única mulher pré-candidata à presidência da República, foi mais um sintoma dessa discrepância. Na foto aparecia a equipe reunida para discutir seu projeto. Apenas homens, para debater a única candidatura feminina nas eleições presidenciais de 2022.
No Congresso Nacional, só 15% dos parlamentares são mulheres. Em SC, a Alesc tem atualmente a maior bancada feminina de toda a história. São cinco mulheres, entre 40 parlamentares. Nunca na história política de Santa Catarina uma mulher foi eleita por seus pares para presidir o Legislativo, embora a bancada feminina conte com nomes experientes. Nenhuma mulher, até hoje, presidiu as duas principais comissões legislativas no Estado, a de Constituição e Justiça e a de Finanças.
A afirmação do deputado, de que as colegas parlamentares “trabalham mais” longe da mesa de decisões soa como se aquele não fosse um lugar a ser ocupado por elas. E essa é uma percepção recorrente entre as mulheres que estão na política partidária: a de que são aceitas e até estimuladas, mas há um limite. Para superá-lo, é preciso superar o machismo estrutural - reforçar a ideia de que os espaços das mulheres são um direito, e não uma concessão.
Atualização:
Em contato com a coluna, após a publicação do texto, o deputado Kennedy Nunes reiterou que sua fala dizia respeito ao trabalho nas comissões. "Respondi que todos os 40 (deputados) têm direito (de disputar vaga na Mesa), mas como o regimento interno da Casa não permite que os membros da mesa participem de comissões, e por entender que as comissões são uma parte importante da Casa, as mulheres que estão nas comissões podem fazer um trabalho muito mais importante" Ele disse ainda que "ninguém se incomodou e parte delas (deputadas) não quer ir para a Mesa por causa disso. Fica amarrado aos trabalhos burocráticos".
Fonte(s): NSC
Comentários